sábado, 29 de outubro de 2022

Se a empresa onde trabalhas te pagasse o mesmo e te mandasse para Lisboa ou Algarve, tu ias?

 A maioria das pessoas não conhece, e nem tem de conhecer, como funcionam os concursos de Professores. Daí que se ouçam muitos comentários, quando alguém se queixa de ter de fazer inúmeros quilómetros para trabalhar e não tem ajudas de custo.

Lia esta semana o seguinte comentário: ‘eu também vou trabalhar para o Porto todos os dias e não tenho ajudas de custo’.

Ora lá está… Alguém que parte do princípio que as profissões são todas iguais e ganham todos da mesma forma…

Mas vamos lá colocar isto de outra perspetiva: Se o teu patrão te dissesse que todos os anos tinhas de ir para uma cidade diferente do país, de norte a sul, e pagava-te o mesmo ordenado, tu ias?


Pronto, a questão reside precisamente aqui. Os professores que arriscam andar nestas vidas, na sua maioria, são contratados, ou seja, ganham pelo índice mais baixo. Isto quer dizer que tiram por mês cerca de 1100 euros. Se conseguirem ficar perto de casa, o que é praticamente impossível nos contratados, não pagam a renda, mas têm de pagar as deslocações, o que equivale a uma renda mensal, uma vez que raramente ficam mesmo ali nas suas cidades. Mas se tiverem de ir para onde há mais falta de professores, mais de metade do ordenado é para as viagens e renda. Isto se viverem em quartos, porque numa casa sozinhos… o mínimo são 500 euros.

Há empresas implementadas em Portugal, como os hipermercados que precisam de muita gente na época alta, que oferecem aos seus colaboradores um suplemento e habitação se quiserem trabalhar durante esses meses no Algarve. Sabem porquê, certo? Obviamente, porque têm falta de pessoal e fica-lhes mais caro formar pessoas à pressa do que oferecer um suplemento ao salário e ajudas de custo nas viagens e na habitação.

Ninguém é mais do que ninguém. É certo. Mas a necessidade fará a sua justiça.

Há muitos professores formados que nunca exercerão. Primeiro, porque enveredaram por outros caminhos, quando viram que não havia colocação; Segundo, porque já não estão para deixar os seus empregos e a sua família para andar de casa às costas, muito menos por 1100 euros. Quem está, continua… Mas quem não está, já não volta…

E isto de quem arrisca ganhar o mesmo perto de casa e longe só se justifica por duas razões: querem mesmo fazer aquilo e estão a pensar na possibilidade de evoluir na carreira, que por si só está uma grande trapalhada na forma como é conduzida…

Podemos ainda acrescentar que eu fui um desses loucos que enveredou por ir por aí abaixo. E quando faço as contas ao que gastei em rendas e deslocações, posso afirmar que já dava para comprar um bom apartamento em Fafe… Mas também digo que o que ganhei a nível cultural, humano e científico me fariam voltar a fazer tudo da mesma forma!

Mas há um momento que já chega, porque nada é tão bom como poder dar um beijinho e um abraço, o nosso abraço, ao meu bebé antes de dormir…

Como a minha história, há milhares. E se querem professores em zonas em que há défice, criem condições para os ter lá e suas famílias… afinal, não fazem o mesmo com outras profissões?

A necessidade cria a oportunidade!

(In jornal Povo de Fafe)