Apresentação da obra de Armando Azevedo
Armando
Azevedo, Professor, Artista Plástico e Performer, desenvolveu um vasto
trabalho, sobretudo na década de 70 e início de 80. Com diversas participações
individuais e colectivas, onde mais tarde se torna bolseiro investigador da
Gulbenkian sobre ‘Trabalho
individual/trabalho colectivo nas Artes Visuais’, destaca-se a cumplicidade
dos seus trabalhos plásticos e performativos, percorrendo, por vezes, os mesmos
lugares e, também, invadindo conscientemente o espaço de cada um.
Numa
época ainda perturbada por um regime ditatorial, começa a frequentar o CAPC
(Círculo de Artes Plásticas de Coimbra) em 1969 e torna-se sócio no ano
seguinte. Verdadeiramente, após algumas manifestações no campo das artes
plásticas, a sua iniciação na performance acontece na resposta à “Agressão com
o nome de Joseph Beuys” de Ernesto Sousa, que decorreu na galeria Ogiva em
Óbidos[1].
Embora
sempre acompanhando os trabalhos artísticos que o CAPC ía desenvolvendo, neste
período intervém mais nas artes plásticas, nos intervalos do cumprimento do
serviço militar, regressando depois definitivamente ao CAPC, agora como
professor, no início de 1976. Este mesmo ano, ainda no auge das manifestações
pós-revolucionárias, numa sociedade que iniciava uma nova fase[2], ficou marcado pelo surgimento de um
novo grupo no campo das artes, o Grupo PUZZLE, em que Armando Azevedo participa
desde a criação, dando-lhe nome e metodologia.
Juntamente
com os elementos do PUZZLE, Armando Azevedo participa pela primeira vez nos
Encontros Internacionais de Arte, os terceiros em Portugal, desta vez na Póvoa
de Varzim, onde, para além das inúmeras intervenções como “puzzle”, realiza a
sua performance mais elaborada (“Janela”). Desde esta data, as suas
intervenções, colectivas - nos respectivos grupos em que participa (GICAPC ou
PUZZLE) ou individuais, multiplicam-se e ganham uma dimensão merecedora de o
levar a participar nas maiores manifestações artísticas nacionais e
internacionais, como os Encontros Internacionais de Arte em Portugal (III -
Póvoa de Varzim e IV - Caldas da Rainha), o 1º Symposium Internacional d’Art e
Performance, organizado por Orlan em Lyon, a Semaine d’Action no Museu de Arte
Moderna em Paris, convidado por Jean-Jacques Lebel e, ao mesmo tempo, expõe na
Diagonale – Paris (convidado pela Galeria de Egídio Álvaro), em performática
inauguração.
Conforme
a indicação no seu percurso, Armando Azevedo percorreu dois campos distintos,
pintura e performance, quer nas suas participações colectivas, quer nas
individuais. Estas participações são divididas pelas intervenções individuais e
colectivas com o Grupo Puzzle e o Grupo Cores ou GICAPC (Grupo de Intervenção
do Círculo de Artes Plásticas de Coimbra). O Grupo Puzzle é reconhecido pela
sua imponência estética e pelos seus membros formados sobretudo pelas Belas
Artes do Porto; o GICAPC tem uma intervenção menos formalista, embora com a
mesma responsabilidade artística.
O
interesse de Armando Azevedo pela performance surgiu em convergência
com algumas experiências teatrais, mas sobretudo com as experiências que
aconteciam no CAPC, um espaço onde se levava uma vida quase contínua e
inteiramente performativa, ainda que não existisse essa consciência rotulada. O
CAPC proporcionava aos seus membros momentos transformados em rituais, o que
aconteceu com “a equipa de futebol”, diversos jogos “de adivinhação e magia”,
“ceias” na cozinha transformada em bar, acesos “colóquios e debates” na sala de
convívio, “festas”… A todas estas vivências, ainda que consideradas banais, era
atribuído um carácter agora assumidamente performativo[3].
Na
tentativa de melhor compreender a obra de Armando Azevedo, agrupamos a sua
actividade performativa, também indicada pelos seus próprios apontamentos [4], em três campos ou secções: Colagem/Palavras; Cores; Corpo/Formas.
Recordamos ainda que a sua prestação artística incidiu sobre duas áreas,
pintura e performance, que se completam e até se confundem na intenção, o que
nos leva a afirmar que não existe, em nenhum dos seus trabalhos, uma sem a
outra. Contudo, será importante reforçar que esta análise não se encerra no que
concerne aos agrupamentos que privilegia, o que pode ter várias outras formas
de análise, mas à luz do que apontam os registos do próprio artista/performer,
esta poderá ser com certeza uma ordenação esclarecedora de toda a sua produção
artística. Para uma exposição mais eficaz, em cada campo de actuação (Colagem,
Cores e Corpo), agrupamos em primeiro as performances ‘individuais’ e depois as
‘colectivas’, que serão auxiliadas, sempre que possível, por um texto do
artista, entrevistas e fotografias.
Quanto
à intenção das obras apresentadas, importa apontar como linha de leitura que
Armando Azevedo, numa arte comprometida com o quotidiano em transformação,
questiona continuadamente a condição humana. A procura da arethê (excelência) ou, mesmo, o homem enquanto «d’eus» é o seu objectivo primordial,
mas nunca dispersando a classe a que pertence o ser humano, isto é, cada homem
é composto pelo seu ‘eu’, o sujeito, e todos os outros são o ‘objecto’; mas só
a junção dos vários ‘egos’ permite a verdadeira sintonia num mundo em
transformação. Por sua vez, esse mesmo mundo é composto pelos pares bem/mal,
verdade/mentira, pureza/poluição, ou seja, há sempre mais do que uma saída e
cada uma é questionável, cabendo ao espectador analisar e avaliar a sua
verdadeira identidade e prosseguir o seu percurso.
Na
nossa opinião, este é o propósito das intervenções individuais e colectivas de
Armando Azevedo, autor de uma vasta e significativa obra, ao afirmar-se nos
meios artísticos de relevo nacional e internacional. Podemos afirmar que a
sociedade, nos seus mais distintos aspectos (sociais, económicos, políticos,
religiosos, profanos, ecológicos) é questionada em cada indivíduo justamente
através da forma (corpo), da cor (brilho) ou palavra (significado).
Cfr. - Metello, Verónica, «notas para uma cronologia»,
(Revista) Marte N.º 3 (2008), Tema: “De que falamos quando falamos em
Performance”, pág. 73.
[4] Cfr. Apontamentos de
Armando Azevedo, Coimbra, 24 de Junho de 2010: «… levei o mesmo de espírito de colectivismo e os performáticos jogos
de palavras, formas e cores.»